[Diário do Mindelact 08]
Quando se pensou na possibilidade de juntar o elenco e o encenador que há 19 anos haviam criado uma peça muito à frente do seu tempo chamada “Lágrimas de Lafcádio”, pensou-se estar perante algo de difícil realização. Sim, difícil. Não impossível. E mesmo que fosse. O festival Mindelact é especialista em quebrar todo o tipo de barreiras que possam existir e transformar delírios em realidades concretas. Foi o que aconteceu, uma vez mais na noite histórica de 26 de Setembro de 2014.
O encenador italiano Lamberto Carrozzi não fazia teatro há 17 anos. O Grupo de Teatro do Centro Cultural Português nunca mais tinha juntado semelhante elenco. Um ator vive em Barcelona, outro estava recém-regressado da Austrália, uma das atrizes residia em Coimbra, o protagonista na cidade da Praia. Como superar todas essas dificuldades logísticas? Acreditamos que o universo conspiraria a nosso favor e abraçamos a aventura.
O que aconteceu foi algo inesperado. Não foi uma remontagem. Uma re-criação, talvez. Mas a peça era a mesma. O texto o mesmo! O que foi que aconteceu neste intenso processo de mais de dez horas diárias de trabalho? Foi algo para mim inédito: os integrantes do elenco estavam vinte anos mais velhos e eram os mesmos. Pois bem, as personagens também estavam vinte anos mais velhas apesar de serem as mesmas. As situações eram as mesmas, mas tinham outra história, outros subtextos, outras motivações. As palavras, muitas vezes eram as mesmas, mas o que as levava a que fossem ditas era todo um percurso de vida de quarenta anos. Há vinte anos atrás Lafcádio tinha vinte anos. Hoje tem quarenta.
Por isso também penso que a encenação de Lamberto Carrozzi, e as novas interpretações de João Paulo Brito, Sílvia Lima, Paulo Miranda, Gabriel Reis e Elisângela Monteiro causaram alguma estranheza no público, nomeadamente naquele que viu o espetáculo na primeira edição do festival Mindelact, em 1995. O que antes era incontida energia, hoje era uma outra coisa, um caminhar seguro em direção à derrota. O que antes era surpresa, hoje representa a banalização da violência, algo que quisemos falar desde o início mas que só vinte anos depois causaria desconforto. Há vinte anos era ficção a preto e branco, quase artesanal, mesmo cenicamente falando. Hoje, estamos muito mais próximos da realidade, de um naturalismo que incomoda, numa cena pintada com as cores da morte.
Foi a primeira vez na vida, e talvez venha a ser a última, que me confrontei com o envelhecimento de personagens. Sempre pensei que a dramaturgia não o permitisse. As personagens são imutáveis. Nascem, vivem e morrem sempre da mesma forma. Tem os seus momentos de glória e de loucura na mesma idade, no mesmo ponto preciso do seu percurso de vida. A este Lafcádio, foi-lhe permitido crescer. Só lhe fez mal. A nós, só nos fez bem.
Quando se pensou na possibilidade de juntar o elenco e o encenador que há 19 anos haviam criado uma peça muito à frente do seu tempo chamada “Lágrimas de Lafcádio”, pensou-se estar perante algo de difícil realização. Sim, difícil. Não impossível. E mesmo que fosse. O festival Mindelact é especialista em quebrar todo o tipo de barreiras que possam existir e transformar delírios em realidades concretas. Foi o que aconteceu, uma vez mais na noite histórica de 26 de Setembro de 2014.
O encenador italiano Lamberto Carrozzi não fazia teatro há 17 anos. O Grupo de Teatro do Centro Cultural Português nunca mais tinha juntado semelhante elenco. Um ator vive em Barcelona, outro estava recém-regressado da Austrália, uma das atrizes residia em Coimbra, o protagonista na cidade da Praia. Como superar todas essas dificuldades logísticas? Acreditamos que o universo conspiraria a nosso favor e abraçamos a aventura.
O que aconteceu foi algo inesperado. Não foi uma remontagem. Uma re-criação, talvez. Mas a peça era a mesma. O texto o mesmo! O que foi que aconteceu neste intenso processo de mais de dez horas diárias de trabalho? Foi algo para mim inédito: os integrantes do elenco estavam vinte anos mais velhos e eram os mesmos. Pois bem, as personagens também estavam vinte anos mais velhas apesar de serem as mesmas. As situações eram as mesmas, mas tinham outra história, outros subtextos, outras motivações. As palavras, muitas vezes eram as mesmas, mas o que as levava a que fossem ditas era todo um percurso de vida de quarenta anos. Há vinte anos atrás Lafcádio tinha vinte anos. Hoje tem quarenta.
Por isso também penso que a encenação de Lamberto Carrozzi, e as novas interpretações de João Paulo Brito, Sílvia Lima, Paulo Miranda, Gabriel Reis e Elisângela Monteiro causaram alguma estranheza no público, nomeadamente naquele que viu o espetáculo na primeira edição do festival Mindelact, em 1995. O que antes era incontida energia, hoje era uma outra coisa, um caminhar seguro em direção à derrota. O que antes era surpresa, hoje representa a banalização da violência, algo que quisemos falar desde o início mas que só vinte anos depois causaria desconforto. Há vinte anos era ficção a preto e branco, quase artesanal, mesmo cenicamente falando. Hoje, estamos muito mais próximos da realidade, de um naturalismo que incomoda, numa cena pintada com as cores da morte.
Foi a primeira vez na vida, e talvez venha a ser a última, que me confrontei com o envelhecimento de personagens. Sempre pensei que a dramaturgia não o permitisse. As personagens são imutáveis. Nascem, vivem e morrem sempre da mesma forma. Tem os seus momentos de glória e de loucura na mesma idade, no mesmo ponto preciso do seu percurso de vida. A este Lafcádio, foi-lhe permitido crescer. Só lhe fez mal. A nós, só nos fez bem.