A vontade de juntar o saber literário de José Luís Peixoto à nossa paixão pelo teatro vem de longe. A ligação do autor a Cabo Verde é forte, intensa e, provavelmente, inspiradora, pois a sua biografia inclui uma passagem pela cidade da Praia, onde viveu durante um ano.
E o tempo, nestas coisas, tem sempre razão. Foram cerca de dez anos entre uma conversa e a concretização da promessa entre dois amigos, tornada possível graças à confiança depositada pelo Tiago Guedes, a quem agradecemos a oportunidade. Decidimos, então, falar sobre essa tal lusofonia, que ninguém sabe muito bem o que é. Juntando a dramaturgia com a encenação, convocamos os espetadores para um debate e uma reflexão sobre esta condição de lusófono, que se sustenta numa língua que é comum só nas aparências. Um espaço geográfico que traspassa todos os continentes e onde o desconhecimento mútuo é regra. Ao colocar três mulheres de três nacionalidades ditas lusófonas numa situação de confinamento, dá-se o mote para a construção de uma ponte que se quer mais real do que virtual, através da criação artística. Através do teatro.
Uma cabo-verdiana, uma portuguesa e uma brasileira estão fechadas na sala de um aeroporto, nos Estados Unidos da América. As três têm em comum a língua – ainda que tenham dificuldade em se compreender mutuamente – e problemas burocráticos para entrar num país estrangeiro. São estrangeiras, perante o novo território e entre elas. O que as liga, efetivamente? Quem é responsável pelas imagens distorcidas que tem umas das outras?
Este espetáculo não é uma metáfora. É um encontro, efetivo e concretizado pela coragem e atrevimento de mentes empenhadas. Com uma equipa artística que se divide pelos nossos três países, e sem aquela necessidade premente de respostas imediatas, foi com prazer que construímos este universo absurdo, que partilha histórias e fragmentos de culturas que, à partida, pensávamos serem apenas nossos.
Porto, 08 de Julho de 2016 (texto da folha de sala, alusiva à estreia do espetáculo)