Uma crónica de José Mena Abrantes, sobre o MarDrama 2015
Terminei a minha última crónica com a aterragem sempre sujeita a ventos cruzados na maravilhosa Ilha de S. Vicente, em Cabo Verde, onde ia participar no MarDrama – Encontro Internacional de Dramaturgia em Língua Portuguesa, organizado pelo responsável do Pólo do Mindelo do Centro Cultural Português, o luso-caboverdiano João Branco.
De Cabo Verde participaram no evento o próprio João Branco, actor e encenador; Abraão Vicente, escritor, artista plástico e deputado da Assembleia Nacional; e Caplan Neves, psicólogo e dramaturgo. Idos do Brasil estiveram presentes Fábio Brandi Torres, do Centro de Dramaturgia Contemporânea de S. Paulo; Lorenna Mesquita, actriz; e o director da SP Escola de Teatro, o dramaturgo, actor e encenador Ivam Cabral. Estiveram também presentes, representando respectivamente Portugal e Angola, o escritor e professor Rui Zink e o autor destas linhas.
Não eram muitos, mas a sua presença garantiu uma mínima diversidade na abordagem do tema central do encontro, que era o de ‘Dramaturgia e Identidades’, tema que, como se sabe, conduz sempre à conclusão de que identidades há tantas como seres humanos no planeta, sem que isso interfira na unidade fundamental que nos liga a todos. Na ocasião foi feito o lançamento da peça que prova isso mesmo -‘Quotidiamo: esta não é uma história de amor’.
Escrita a oito mãos por Rui Zink, Abraão Vicente, Ivam Cabral e eu próprio, numa sequência que não envolveu qualquer troca de impressões prévia, essa peça, editada pela angolana Mayamba, deu o mote para o estabelecimento de novas pontes criativas entre esses autores e cerca de vinte pessoas inscritas para uma curiosa e inédita ‘oficina de escrita’, que nos fez navegar por mares desconhecidos no quadro do MarDrama.
Sob orientação de cada um dos autores do ‘Quotidiamo’ foram criados quatro grupos, cada um encarregado de iniciar um texto dramático que seria continuado pelos restantes grupos, em permanente regime cruzado. Todos participaram, portanto, na elaboração das quatro peças surgidas num tempo recorde de apenas quatro horas, em duas sessões consecutivas.
Isso não foi lá muito animador para aqueles que, como nós, já são tidos como dramaturgos, porque todo o mundo pôde constatar que afinal não é assim tão difícil escrever uma peça de teatro… Se calhar foi já com essa intenção que o João Branco nos pregou essa ‘rasteira’, que esperamos motive ainda mais os co-autores para a escrita dramática. Em especial aqueles (aquelas, mais propriamente, porque só participaram meninas) que entregaram os seus textos para o concurso de dramaturgia promovido pela organização do encontro.
Mas limitar o MarDrama a esses momentos, seria retirar-lhe o que ele teve de mais importante, que foi o encontro afectivo entre pessoas de três continentes, todas elas envolvidas em projectos ligados às artes cénicas, e entre estas e as novas gerações de jovens cabo-verdianos, que se concretizou não apenas na ‘oficina de escrita’, mas também em duas visitas a escolas secundárias do Mindelo para troca de impressões entre alunos, professores e dramaturgos convidados.
Não faltaram também ao MarDrama os espectáculos de teatro: o longo e sentido monólogo da actriz brasileira Lorenna Mesquita sobre a vida de Florbela Espanca, construído com as palavras da própria poetisa portuguesa, e a peça ‘Teorema do silêncio’, de Caplan Neves, com direcção de João Branco, sobre o sempre difícil tema da pedofilia e do abuso sexual de menores.
Seria injusto sair do Mindelo sem uma chamada de atenção para o mais generoso projecto cultural em curso na cidade – a criação da Academia Livre de Artes Integradas do Mindelo (ALAIM), que procura recuperar um amplo espaço ao abandono para abrigar e acarinhar todas as vocações e dar formação em todas as disciplinas artísticas aos jovens mindelenses. O projecto só ainda não avançou, porque não tem apoio oficial e depende de contributos individuais. Do nosso também, por que não?
O MarDrama, nascido no Mindelo da sempre agitada cabeça do João Branco (“viciado em teatro”, já lhe chamaram!), vai agora, por decisão unânime dos que nele participaram, ter continuidade no próximo ano em S. Paulo e em 2017 em Luanda. Os mares que separam os nossos países e que nos legaram tantos dramas e tragédias, podem agora unir-nos na partilha de textos teatrais que contribuam para aprofundar o conhecimento uns dos outros. Afinal, nem todos os dramas são naufrágios…
Terminei a minha última crónica com a aterragem sempre sujeita a ventos cruzados na maravilhosa Ilha de S. Vicente, em Cabo Verde, onde ia participar no MarDrama – Encontro Internacional de Dramaturgia em Língua Portuguesa, organizado pelo responsável do Pólo do Mindelo do Centro Cultural Português, o luso-caboverdiano João Branco.
De Cabo Verde participaram no evento o próprio João Branco, actor e encenador; Abraão Vicente, escritor, artista plástico e deputado da Assembleia Nacional; e Caplan Neves, psicólogo e dramaturgo. Idos do Brasil estiveram presentes Fábio Brandi Torres, do Centro de Dramaturgia Contemporânea de S. Paulo; Lorenna Mesquita, actriz; e o director da SP Escola de Teatro, o dramaturgo, actor e encenador Ivam Cabral. Estiveram também presentes, representando respectivamente Portugal e Angola, o escritor e professor Rui Zink e o autor destas linhas.
Não eram muitos, mas a sua presença garantiu uma mínima diversidade na abordagem do tema central do encontro, que era o de ‘Dramaturgia e Identidades’, tema que, como se sabe, conduz sempre à conclusão de que identidades há tantas como seres humanos no planeta, sem que isso interfira na unidade fundamental que nos liga a todos. Na ocasião foi feito o lançamento da peça que prova isso mesmo -‘Quotidiamo: esta não é uma história de amor’.
Escrita a oito mãos por Rui Zink, Abraão Vicente, Ivam Cabral e eu próprio, numa sequência que não envolveu qualquer troca de impressões prévia, essa peça, editada pela angolana Mayamba, deu o mote para o estabelecimento de novas pontes criativas entre esses autores e cerca de vinte pessoas inscritas para uma curiosa e inédita ‘oficina de escrita’, que nos fez navegar por mares desconhecidos no quadro do MarDrama.
Sob orientação de cada um dos autores do ‘Quotidiamo’ foram criados quatro grupos, cada um encarregado de iniciar um texto dramático que seria continuado pelos restantes grupos, em permanente regime cruzado. Todos participaram, portanto, na elaboração das quatro peças surgidas num tempo recorde de apenas quatro horas, em duas sessões consecutivas.
Isso não foi lá muito animador para aqueles que, como nós, já são tidos como dramaturgos, porque todo o mundo pôde constatar que afinal não é assim tão difícil escrever uma peça de teatro… Se calhar foi já com essa intenção que o João Branco nos pregou essa ‘rasteira’, que esperamos motive ainda mais os co-autores para a escrita dramática. Em especial aqueles (aquelas, mais propriamente, porque só participaram meninas) que entregaram os seus textos para o concurso de dramaturgia promovido pela organização do encontro.
Mas limitar o MarDrama a esses momentos, seria retirar-lhe o que ele teve de mais importante, que foi o encontro afectivo entre pessoas de três continentes, todas elas envolvidas em projectos ligados às artes cénicas, e entre estas e as novas gerações de jovens cabo-verdianos, que se concretizou não apenas na ‘oficina de escrita’, mas também em duas visitas a escolas secundárias do Mindelo para troca de impressões entre alunos, professores e dramaturgos convidados.
Não faltaram também ao MarDrama os espectáculos de teatro: o longo e sentido monólogo da actriz brasileira Lorenna Mesquita sobre a vida de Florbela Espanca, construído com as palavras da própria poetisa portuguesa, e a peça ‘Teorema do silêncio’, de Caplan Neves, com direcção de João Branco, sobre o sempre difícil tema da pedofilia e do abuso sexual de menores.
Seria injusto sair do Mindelo sem uma chamada de atenção para o mais generoso projecto cultural em curso na cidade – a criação da Academia Livre de Artes Integradas do Mindelo (ALAIM), que procura recuperar um amplo espaço ao abandono para abrigar e acarinhar todas as vocações e dar formação em todas as disciplinas artísticas aos jovens mindelenses. O projecto só ainda não avançou, porque não tem apoio oficial e depende de contributos individuais. Do nosso também, por que não?
O MarDrama, nascido no Mindelo da sempre agitada cabeça do João Branco (“viciado em teatro”, já lhe chamaram!), vai agora, por decisão unânime dos que nele participaram, ter continuidade no próximo ano em S. Paulo e em 2017 em Luanda. Os mares que separam os nossos países e que nos legaram tantos dramas e tragédias, podem agora unir-nos na partilha de textos teatrais que contribuam para aprofundar o conhecimento uns dos outros. Afinal, nem todos os dramas são naufrágios…